Foi revirando a bolsa guardada há meses que ela encontrou algumas lembranças registradas por alguma razão, escritas à próprio punho com a grafia torta de quem tenta escrever apoiada nas pernas ou no balançar das viagens de ônibus que costumava fazer. Talvez umas dez páginas, no máximo, mas cada página foi uma viagem no tempo instantânea para os dias descritos. Reviveu e ressentiu tudo novamente, cada palavra ruim e cada sentimento bom. Lembrou até do que não estava explicitamente escrito e de quando, sorrindo por sorrir, prometeu àquele que a inspirava que descreveria vossos momentos em toda aquela agenda e que só quando não sobrasse mais nenhum espaço em branco, lhe entregaria. Como visto, não cumprira o prometido e parou de escrever antes mesmo que tivesse 10 minutos de leitura. Talvez uma das últimas inscrições descreva o motivo de não escrever mais ou talvez o motivo ficou perdido naquele ano. Aquele conjunto de folhas com uma capa dura de desenho certamente tinha muita importância para ela, mas sabia que o destinatário não se lembraria mais que durante meses ela parava para avaliar o dia com ele e quando voltava do sonho, escrevia em algum lugar, fosse na agenda, na internet, no celular ou no seu subconsciente. Na tarde daquele dia, um SMS lembrou-a porque escrevia e apoiada nas pernas no tremor do metrô, registrou mais um momento relacionado àquele que é o motivo dos pensamentos bobos dela há quase três anos. Escrevia porque alimentava um sentimento no fututo, e acreditava que Um Dia, juntos, sentariam em uma sombra fresca, abririam em uma página qualquer e relembrariam daquele dia sorrindo, como sempre faziam. Como sabem, uma boa viagem de metrô faz as pessoas refletirem. Depois que escreveu aquele dia, ela sentiu a claridade invadir seus olhos, os sentimentos transbordarem do coração, guardou a agenda na bolsa mais uma vez e resolveu deixá-la lá, sem planos futuros para ela, apenas guardada no momento.
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